30/05/2014

Morte sem glamour


O AVC tem-me trazido várias descobertas de caráter filosófico. A primeira delas - talvez a mais importante - é que a morte é um fenômeno frio, racional, objetivo, sem nenhum glamour. Essa minha entrada no estado de coma foi apagada completamente da minha memória. Não me lembro mais da entrada na sala cirúrgica, menos ainda de meu retorno à vida. Pelo que disse minha mulher, fiquei "apagado", fiquei apagado 24 horas ou mais. Podia ter morrido. E não restou na consciência nada que de longe lembre essa crise. A melhor imagem que eu concebo para descrever o que aconteceu é de que a vida, o estado da razão, é mantida por uma chave elétrica. Se alguém desligar esta chave, apagamos.      
Isto é a morte. Simples assim.


25/05/2014

Comunicação, a velha dificuldade dos médicos.


Campinas dia 24 de julho de 2013. Estou na mesa de cirurgia do Hospital da UNICAMP e fui submetido a uma cirurgia de revascularização com implantação de duas pontes de safena e uma mamária.
            Para isso, os médicos "desligaram" meu coração e pulmões, conectando-me a uma máquina de circulação extracorpórea por mais de duas horas.
            Com isso, os riscos de eu ter um acidente aumentaram vertiginosamente... Foi o que aconteceu: uma placa de gordura tapou um dos vasos do cérebro e eu apaguei! Foi um acidente isquêmico que é, segundo os médicos, menos grave que o hemorrágico.
           Um dos médicos que me assistiram chegou a prever para minha mulher, Susana, que a paralisia de meu lado direito (braço e perna) era irreverssível, não voltaria mais a andar. Não sei exatamente o que aconteceu, mas meu organismo mostra disposição de contrariar as previsões mais sinistras. O movimento da mão e do braço já retornaram, embora os médicos não gostem de fazer previsões, parece certo que eu estou na iminência de voltar a andar.
           Três dias após a cirurgia meus familiares podiam comemorar o meu restabelecimento bem razoável. Recuperei a fala, raciocínio, memória, humor e restou-me a paralisia do braço e perna direita.
          Ao longo da vida estudei com certa profundidade a comunicação dos médicos com seus pacientes. Guardo comigo alguns apontamentos para sugerir aos profissionais da saúde de modo geral dicas para uma boa comunicação sobretudo na transmissão de más notícias. Num determinado momento aconselho os médicos: “a comunicação da má notícia não abre espaço para mentiras e nem tampouco para a verdade pronunciada com aquele distanciamento próximo da crueldade”.